domingo, 9 de fevereiro de 2014

Conviver

Conviver talvez seja a mais difícil das artes.
Pois relacionar-se significa admitir o outro, descer do pedestal construído por nós mesmos
e deixar que entrem no nosso espaço.Significa submeter-se a análise alheia e , quem sabe ,à critica.Significa arriscar. Correm-se riscos todos os dias.Arriscamos palpites , novos projetos , dinheiro...
Difícil mesmo é arriscar falar a verdade.É arriscar-se perante o outro.
Porque na verdade nos fragilizamos, estamos inteiros, nus.Porque a verdade nos coloca como simples mortais, suscetíveis ao fracasso ou ao sucesso.
E que inquietante é a dúvida, o “se”.Há quem use a dúvida como instrumento de aprisionamento e na duvida não permitimos que o outro nos conheça plenamente.Sem conhecer a verdade , tudo é possível, de melhor e pior e o não ainda é só uma hipótese.Difícil é ouvir a verdade, mais ainda falar.
Mas a verdade liberta.Porque retira nossas máscaras.Porque mostra os fatos como eles são.
Arriscar uma paixão, uma palavra, um gesto ,é arriscar rejeição.Por isso tantos amores platônicos.
Muito mais fácil permanecer na contemplação , e então deixar que o outro pense o que quiser de nós.Por meio de omissões ou meias verdades, podemos dar a entender uma infinidade de coisas , por isso é tão importante a comunicação não verbal.
Através dela, com um pouco de sensibilidade , pode-se tentar decifrar um pouco do outro , esse desconhecido, e buscar um entendimento.
Há quem jamais ouse atravessar a fronteira entre a duvida e a verdade e prefira o nada , a arriscar o fracasso.
Mas somente a verdade é capaz de transformar o “se” em algo concreto.E somente dessa forma é possível ser livre.
Somente quando conseguimos romper essa barreira do medo, nos tornamos humanos e permitimos ao outro nos conhecer e ,quem sabe, nos amar.Não só o amor romântico, mas o amor como um todo, sendo este tão abrangente e por assim mesmo, livre.
Fala-se muito de paixão , mas o amor é o único que não aprisiona o objeto amado.Porque o amor ama o outro, não a imagem construída dele.Porque o amor permite, aceita ,compreende o outro na sua totalidade.Porque o amor não precisa de fatos, pois é feito de certezas.A paixão aprisiona e fragiliza.O amor liberta.A paixão não espera , o amor sim.
A paixão acaba, o amor se transforma, sem deixar de ser ele mesmo.A paixão mitifica.O amor desconstrói.A paixão é estúpida,o amor é racional.
Somente quando nos for possível entender nossas relações importantes como relações de amor, será possível buscar soluções racionais para o eterno problema do conviver.
Somente quando aceitarmos o amor , não como um contrato indissolúvel , mas como uma característica humana, involuntário e , principalmente, plural, será possível que finalmente nos façamos entender pelo outro e vice-versa.
Entender a química da atração , do sexo e da complexidade humana e não achar que o amor é capaz de transformar o outro em escravo, fazendo –o cativo de seus desejos.Entender a infinitude das relações, sem que aja necessidade de compromissos formais, de estabelecer regras, para a legitimação do amor.
E , principalmente entender o quão necessário é arriscar-se, porque só na desconstrução de si mesmo para o outro é possível entender-se e evoluir, dentro da condição humana.
texto publicado originalmente no blog Vida Carioca-2006.

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

2014

por um 2014... com menos"eu sei" e mais "me ensina" com menos "eu vou" e mais "vamos juntos"? com menos"eu nao quero" e mais "vamos ver no que dá?" com menos "é complicado" e mais " é diferente" com menos certezas e mais dúvidas com menos "codinome beija-flor" e mais "todo amor que houver nessa vida" com mais encontros e menos desencontros com menos "voce nao serve" e mais " queremos voce aqui" com menos "nao consigo" e mais "vou tentar" com menos "ele/ela nao combina comigo" e mais "adoro nossas diferenças" com menos " antipatias" e mais " amores à primeira vista" com menos perfeccionismo e mais encantamento com menos razao e mais afeto com menos "observar " e mais "tomar parte" com menos "nunca mais" e mais "todos os dias" com menos portas fechadas e mais janelas abertas com menos "tenho medo,nao vou " e mais " vou assim mesmo" com menos "nao gosto disso " e mais " quero conhecer isso" com menos palavras inuteis e mais acoes necessarias com menos lagrimas e e mais sorrisos com menos intolerância e mais compreensão com menos resmungos e mais suspiros com menos silencios e mais musicas com menos filas e mais cirandas com menos discursos e mais poesia com menos odio e mais perdão com menos punhos fechados e mais maos dadas com menos mascaras e mentiras e mais pessoas que sao de verdade

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Nós

vai meu amor,que já é hora.
e o trem aponta na estação.
Nos trilhos escorrem os minutos na tarefa de te levar pra longe
dia após dia no exercício diário de existir.
Bem sabemos que as horas são sempre mais rápidas aqui dentro do que lá fora
nem bem começamos a abrir a janela e já o alarme soa,inclemente
nos obrigando a caminhar
Aqui dentro,nosso sofá,nossas paisagens,as mãos dadas e a certeza de ser dois.
Aqui dentro,nossos pequenos momentos,nossas eternidades divididas em infinitos abraços,corpos e mentes que compartilham,
somam-se,dividem tempo e espaço.Não nos importa como nem onde:somos.
Que importa o que reside lá fora?Com você,já reservo meu quinhão de felicidade,felicidade que não é de fogos de
artifício,mas de existir,cotidianamente,lado a lado no travesseiro.
Lembra que o sonho se constroi de tijolos,que pomos um a um,há treze anos,desde que enlaçamos uma vida na outra.
Do lado de fora fica o mundo. Aqui dentro sempre estaremos nós.

sábado, 1 de junho de 2013

Sobre o trem na estação


Trilha sonora: Diga lá meu coração-Gonzaguinha

Lá fora soa o apito do trem na estação.
Como de súbito, corta todas as pequenas certezas da manhã
e invade o peito dos que conseguem ouvi-lo.
Em algum lugar, a mulher realiza seu rude trabalho, mãos ocupadas, olhos inquietos.
O peito pesa, mas os braços não param.
É preciso, afinal de contas, produzir.
Sentado em sua sala, no prédio mais alto, o banqueiro conta notas, absorto.
Ele também não ouve o apito e prossegue na estúpida faina de acumular a existência.
É preciso afinal de contas, garantir.
Em outro ponto da cidade, a assistente social, fechada em seu escritório, conta estatísticas.
De há muito ela não ouve, ou finge não ouvir, o apito do trem.
Havia o impulso, desde sempre, de construir alicerces cada vez mais fortes
e no tempo de cada tijolo ficaram para trás seus sonhos de juventude.
É preciso afinal de contas, proteger-se.
Mais afastados, os dois namorados ouvem juntos o apito do trem.
Mãos dadas, olhos em lágrimas, eles sabem que só é possível ir um de cada vez.
Malas nas mãos, ele olha uma última vez para trás,
beija-a de leve e caminha devagar para a estação.
Ela sabe que, mais cedo ou mais tarde, também embarcará nesse vagão.
É preciso, afinal de contas, esperar o tempo certo de saltar.
Na estação de trem, a velha senhora, ex-faxineira do lugar, desce calmamente do vagão.
Ela já ouvira em tempos anteriores, o mesmo apito que hoje soa na cidade.
Corajosamente, tomara da bolsa, beijara os queridos e partira dali.
Hoje, ocasionalmente, embarca no mesmo trem para, vez ou outra,
trazer uma fatia de bolo e comentar os últimos acontecimentos.
Chama-se Graça e entre os passantes, não há quem não a conheça.
Silenciosamente, o velho solteirão, continua seu lento trabalho.
Ele ouve o apito e, calmamente, abre sua agenda, risca mais um dia
que o separa para sua aposentadoria toma um gole de leite frio
e prossegue na produção.
É preciso, afinal de contas, repetir.
Na cabine do maquinista, as mãos sujas de carvão, o funcionário da ferrovia,
soa pela última vez o apito.
Dá uma olhada em volta, confere se ainda há mais alguém e se prepara para partir.
Nesse momento, no fim da estrada, vem correndo uma moça, sobraçando pacotes.
Os cabelos soltos, despenteada, roupas amassadas,
ela se aproxima correndo do vagão do trem.
Em um último suspiro, antes de subir, olha para trás.
A assistente social, o banqueiro, o velho e muito outros, acenam para ela.
Ela sorri e registra, carinhosamente, cada rosto, um a um.
Sopra um beijo, respira fundo e sobe corajosamente no vagão.
Para trás ficaram as horas, no cansaço da espera do trem.
No coração, vão seguir com ela, todos aqueles que permaneceram ali.
Ela sempre soube no fundo, que esse dia iria chegar.
O apito soa, o vagão sacode, o maquinista coloca o chapéu.
O bilheteiro, indiferente, recolhe o dinheiro e entrega as passagens a cada um.
A moça paga, se aproxima da janela, sente o vento frio bater no rosto.
O trem se move, vai aos poucos saindo da estação.
Logo à frente, há uma curva na estrada, não é possível saber onde vai dar.
A moça sorri, aguarda em silêncio e respira fundo.
Ela sabe que afinal de contas, é preciso,mais do que nunca,prosseguir

quinta-feira, 18 de abril de 2013

ainda o imponderável


Hoje o coração ficou pequeno
De súbito, todos os anos, palavras e sentimentos
voltaram à tona, por sobre a tampa de dor.
Vieram assim, risos e silêncios, numa proximidade única.
Os momentos de sol, as tardes cinzentas.
no compartilhar do sentido, na certeza de ser dois.
Sem querer, o pensamento vaga até o momento da separação.
E indaga, por mais que não queria, por quê?
Se havia tudo, se éramos tanto, por que o “não”?
Por que a mágoa e a raiva, onde antes a comunicação se fazia eterna?
Implacáveis, a dor e o silêncio pairando por sobre a poeira nas fotos,
que antes abrigava os contornos de ser cúmplice, de ser irmão?
Seguimos caminhos distintos e de onde posso ver, até somos felizes.
Mas quando volto minha cabeça, ainda enxergo
palavras que me consolam,
palavras que me preenchem,
Compreensão de pertencer a dois mundos
e saber o espaço exato do outro,
no exercício de dialogar
Acima de toda a magia, ficou o medo.
Acima de todo o amor, ficou a dúvida.
Acima de todo diálogo, ficou a raiva por não poder ser mais.
E éramos tanto.
Ficou a certeza de que muito antes de todo o silêncio,
Houve um primeiro momento em que a raiva falou mais alto, onde as palavras se fizeram ásperas
e o que era comum, virou estranhamento e desconfiança.
medo.
A partir dai, acabou-se o encanto de um afeto único,
a certeza do espelho ao alcance das mãos.
Onde estávamos quando quebramos nosso reflexo,
na raiva de sabermo-nos únicas, sozinhas,
perdidas em nossos pecados e nossas limitações?
Éramos tão fortes,
por que cedemos aos mesquinhos apelos da dúvida,
por que nos vimos como desapartadas do eu,
por que ignoramos o essencial, para além das palavras?
Queimamos nossas cartas,
preenchemos de "novos" nossas existências individuais.
E, na maior parte do tempo, nos sentimos demasiadamente mais leves.
Não poderia mesmo ser tarefa fácil,levar parte de si no outro,assim,ao descontrole.
Mas resta, por mais não queiramos, uma laço invisível no âmago do senão,
que não convida ao retorno, mas aponta para uma coexistência na distância.
Se não permanece com o mesmo estar próximo,
ao menos entende a infinitude do existir,
na curva do tempo,
onde reside o imponderável.

quinta-feira, 14 de março de 2013

Pais e filhos



Filhos são espelhos em que algum momento
não temos coragem de olhar.
são caminhos em direção ao mais visceral de nós mesmos,
nossa imensa capacidade de amar,
aliada a infinita estupidez de nos pensarmos eternos.
Somos frágeis em nossa certeza
de que haverá mais um dia
para que possamos dizer
todas as palavras que saíram mal ajambradas,
amarrotadas pela pressa do cotidiano.
Não há mais tempo.
Tudo sempre está sendo
e a cada momento ficamos mais longe
de todos os planos que fazemos
quando a ideia de ser pai de alguém começa a ser formulada em nossa cabeça.
já no primeiro minuto de existência, há muito mais amor do que sabedoria
e nossas mãos são sempre grandes demais,
nosso peito demasiadamente pesado
para tocar um ser tão delicado.
Ainda quando são hipóteses,o simples mover de um músculo,
protegido pela barriga
Já nos toma de um tal encantamento que paralisa qualquer capacidade de raciocínio.
Não há como fugir,eles estão ali,conectados a nós,
informando-nos que cessou de imediato nossa egocêntrica existência.
A partir de agora,somos duas partes,
uma com o compromisso de cuidar
e a outra,de crescer e ser alguém diferente,assim dizemos.
Mas é ao passo que nascem e lhes olhamos o rosto,
Que magia profunda é essa
que os constitui assim tão próximos,
como um reflexo onde se projetam nossos melhores ângulos.
Já é a curva da sobrancelha, ou a ponta do nariz,
sombreando detalhes que risonhamente encontramos.
São enfim, a melhor parte de nós mesmos
e é com orgulho que lhes apresentamos aos demais.
É a cara do pai, dirão alguns.
Parece mais com a mãe, concordarão outros.
O fato é que aquele ser de pele macia e mãos pequenas
ainda nesse tempo o ama incondicionalmente
porque faz parte de você.
O tempo e os pequenos passos iniciarão a necessária caminhada
em busca de si mesmo
e a cada momento pensaremos no instante em que nos dirão adeus.
Mas há tanto afeto e tanta confiança que parece tolo ater-se a isso.
Os dias passam como uma constante montanha russa
onde se passa da emoção mais profunda ao cansaço mais absoluto
e um sentimento de urgência nas necessidades a atender.
Começamos enfim a mostrar-lhes o mundo e um pouco de nós mesmos
e é comovente como acreditam em nossas palavras,
por mais loucas possam ser.
E quanto a nós, não há nada que nos faça mais feliz
do que o cheiro calmo de seus pijamas
de malha e a sensação plena de pô-los finalmente na cama
após um dia de brincadeiras
e observa-los dormir.
A vida parece aos poucos encaixar-se no relógio
e guardamos para nós as inseguranças que tínhamos antes.
Fazemo-nos fortes para que confiem em nós
e tudo parece caminhar bem.
Mas é ali,bem próximo, que o tempo principia a acelerar
e nos surpreende
com pés e pernas que se espicham e as primeiras espinhas
e um estado permanente de inadequação.
Ainda tentamos parecer confiantes
mas não temos ideia de onde tal metamorfose vai levar.
A única coisa que sabemos é que sim,doi um bocado
e demora a passar.
Tentamos todas as estratégias de antes:histórias ao pé da cama,
leite morno antes de dormir,brigadeiro de panela,
cosquinhas na barriga
e até a mais completa e hipócrita indiferença.
Afinal,somos adultos e é preciso trabalhar.
Nossos projetos,tantas vezes adiados,
precisam ser postos em prática
e não é possível que esse menino
não possa deixar-me em paz
ao menos um dia.
E assim,ao exato momento de pronunciar essas palavras,
são ouvidas de forma definitiva,
como tudo nessa fase da vida.
Principiam a desconfiar.
Fazem-se calados,muito quietos,
procuram outros colos e outras diversões.
E de súbito,quando voltamos nossos rostos por um momento para longe do trabalho,
em um segundo o silêncio é pesado e total
Fecharam a porta para seu mundo interior
e ficamos de fora de suas vidas.
Ás vezes,aparecem de longe,nos dão breve boletim
e retornam para seus afazeres.
Permanecemos parados,ainda esperando
que possam tornar a ser o que eram.
A distância nos faz enxergar-lhes como um espelho
onde nossos defeitos se refletem incessantemente.
Onde plantamos ausências,colhemos silêncio.
Onde deixamos raiva,colhemos mágoa
E onde nossas mãos não chegaram,
feias cicatrizes podem de súbito aparecer.
É preciso sempre estar atento a tudo o que fazem,
vendo-os a cada dia crescer com um aperto no peito
e com uma igualmente enorme felicidade,de senti-los experimentar as asas
e cair nas primeiras tentativas.
Proibí-los até onde pudermos
de se jogarem pela primeira janela,
mesmo sabendo que existirão aquelas
de onde se precipitarão sem nosso consentimento.
Haverá um dia,em que, no caminho diário
que traçaram para si mesmos,
Voltarão seus olhos pra trás e nos sorrirão brevemente.
De onde estamos,os olhos molhados como convém serem
os olhos de todos os pais,
acenaremos,dando-lhes a certeza de que estaremos sempre ali.
Arnaldo Antunes e Brás Moreau Antunes - "OLHA PRA MIM"

domingo, 10 de março de 2013

canção para menina ao longe

...por hora ficaremos assim... tu e eu no mais completo silêncio.
Enquanto tu abres a janela, eu espero em vigília que volte seu rosto só um pouco mais pra cá.
Sobre a mesa, recortes de vida, recordações de um tempo que passou.
Quando andávamos juntas, mãos dadas, sorriso no rosto.
Era o tempo dos porquês e teus braços se erguiam continuamente em direção aos meus
e o mundo era pequeno para todas as cores que eu queria te mostrar.
Era como se a ti reservasse a melhor parte de mim, todos os meus sonhos e fantasias
E aos poucos os erguesse um a um diante dos seus olhos.
Juntas construímos castelos e caminhos os mais belos.
Trememos ao mesmo tempo ante bruxos e dragões
De mãos dadas acompanhamos a trajetória de dezenas de heróis.
E quando tudo parecia não ter remédio, era sempre hora da pausa para a pipoca,
entre travesseiros e edredons.
Quisera poder ainda hoje curar todas as dores com um toque de chocolate e duas gotas de brigadeiro.
Quisera que ainda buscasse meu colo como um porto seguro,
mas são outras tuas urgências e eu tenho apenas duas mãos.
Vejo com alegria cada dia do teu crescimento e me orgulho tanto de seres o que és,
Mas percebo que a vida te afasta a cada dia mais de perto de mim.
Não há o que lamentar .
É do tempo e das engrenagens do mundo que te faças cada vez mais sua e menos minha,
enquanto passam as horas e os dias de tua existência.
E enquanto buscas a ti mesma, como é o fato de cada um de nós,
me deixo estar por aqui, aguardando que em dado momento da estrada,
voltes teu rosto somente um pouco para trás.
E então, desprovidos já de toda a raiva que a juventude te deu,
teus olhos possam enxergar novamente
um pouco de mim em cada ato seu
e enfim possa esboçar um breve sorriso,
enquanto caminhas em direção ao sol.

sábado, 9 de março de 2013

Into the pub


Na calçada vazia o porteiro ergue as correntes do chão, dividindo espaços público e privado, afinal de contas é preciso proteger o capital. As garçonetes, sonolentas, vão chegando uma a uma e passando pela entrada, sem notar a reluzente placa que identifica o lugar. Vão chegando os primeiros clientes e se deparam com paredes envelhecidas, madeira que se estende pelo teto, dividindo espaço com artefatos antigos que hoje têm o pomposo nome de “retrô”. No canto, algumas capas de discos registram que Elvis, o Rei, ainda não morreu e nas colunas que sustentam o estabelecimento, há moças e rapazes sambando em tinta, erguidos em quadros coloridos que dividem espaço com bandeiras e brasões. Não há dúvida de que se esta num pub, dos que guardam a atmosfera caótica das sextas-feiras e cuja cartela de etílicos sustenta nomes dos mais diversos países. No fundo, absoluta, está ela, a Juke Box, rolando um dance 90´s despretensioso. Nas mesas altas e redondas as bolsas se acumulam e os cotovelos dividem espaço com os primeiros copos. O salão ainda está vazio, mas as garçonetes já se movimentam, serelepes, cada qual com sua blusa colorida e um jeito descolado de estar em casa. É hora do brinde e os drinks coloridos chegam inúmeros e enormes, esculturas de gelo, álcool e frutas, erguidos em saudação ao início do fim de semana. Lá fora, a fila começa e é com alegria que cada grupo chega. Em poucos minutos as mesas começam a ser ocupadas por grupos diversos, casais, amigos de faculdade, trabalhadores e meninas, muitas meninas, soltos os cabelos e o riso sob os sapatos dos mais variados tipos.Vê-se gente de todas as formas se espalhando no salão e abraçando os amigos, como uma festa combinada, sem motivo aparente, como se o simples fato de ser sexta-feira e estarem juntos fosse motivo para uma sensação irresponsável e deliciosa de estar vivo e dançar . Em algum momento, o salão vai estar lotado e as câmeras e celulares vão espocar em flashes de cada detalhe: o balcão de madeira, as luminárias de baldes de cerveja, o presente que se ganhou. E cada um que chega se espreme entre as mesas para encontrar seu grupo e fazer parte da festa, mesmo que seja em pé. Os copos já se acumulam nas mesas, junto com as cestas de batatas-fritas e as garçonetes correm, frenéticas, levando e trazendo cardápios, se esgueirando pelas mesas e passando por debaixo dos balcões, suas blusas como manchas coloridas que se deslocam com velocidade pelo pub mal iluminado. Em cada rosto há um ar de festa e as fotos agora são uma constante, ritmadas pela batida da musica que toca constantemente da juke Box, até o momento da chegada do DJ. Ele adentra o espaço discretamente e se coloca ao lado do som, aguardando pacientemente o final da música para começar seu set. A seu comando, as conversas se tornam mais esparsas e vozes e braços se erguem no ritmo da música. Nada combinado. É somente o fato de estarem ali, compartilhando a experiência que faz a todos felizes, cantando músicas novas e antigas, sob a luz esparsa do lugar. Os minutos correm e já não há pressa, afinal o fim de semana se instalou sorrateiramente por entre as mesas e a única preocupação é encontrar as coloridas garçonetes e pedir mais um drink. A sexta-feira, inevitavelmente, merece ser comemorada,em prosa,verso e álcool.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

ousar sonhar

Então você abre a janela e diz: e dai?
o vento bate,o sol aquece e o azul do céu é o próprio convite ao movimento.
mas você diz:e dai?
o que me resta,quando já todos saíram e meus armários quedam-se vazios,sem retratos a
admirar ou cartas velhas,pra chorar?
então eu te digo:te resta o mundo.
Restam tuas mãos vazias e os vestido de sonho a rodar infinitamente por sobre o azul. Não escuta o silêncio onde antes havia a espera de uma voz há tempos esquecida?
É tempo de ouvir sua própria voz e propor uma nova canção.
É tempo de sorrir sozinha e abrir todas as portas,todas as janelas que ousar imaginar.
quando a realidade é uma promessa,
nada mais resta do que sonhar.
Liberdade-Marcelo Camelo

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

por hora

Há um momento em que todas as palavras quedam ao chão, inertes
Tempo onde as dores forçam os joelhos ao solo
e as costas tombam ante o despreparo da alma.
Tentar erguer-se ante o imperioso apelo do não é inútil.
Precisas baixar por um momento a cabeça
e deixar que o desespero uma vez só,vença a batalha que tão insistentemente travas;
Tu mesmo contra tua sombra, tuas vontades contra a força do Mundo,
tuas pobres mãos,ante a inabalável certeza do não.
É hora de recolher-se quieto, muito quieto, enquanto a tempestade passa.
É hora de deixar que o tempo faça seu trabalho e percorra cada canto da casa,
erguendo a poeira dos mais remotos esconderijos.
Permanece em silêncio, deixando que o relógio faça seu trabalho.Mergulha solitário por entre camadas de breu.
Há de chegar o tempo de abrir a janela e contemplar novamente o sol.
Por hora tranca tuas portas, esvazia tuas mãos, espera que o tempo passe e que o vento chegue.

O vento(A uma menina)

Abre a as janelas do tempo, menina
que as horas acompanham o seu respirar.
Ja é tarde,dizem os relógios,mas o tempo sabe;
que a sua hora é hoje no dia de sempre,
quando suas dores ja dormem guardadas em caixas no fundo do armário
E ja é momento de deixar o silêncio atrás de você.
Pelas frestas da porta já se vê a luz,que insiste em entrar.
Ao longe múltiplas vozes,na incerta música do talvez.
Chega à janela.Contempla o sol,sente o vento leve que bate em seu rosto.
Pra além das dores,erga seu rosto e contemple o vazio.
Ainda que cada passo dolorosamente convide à inércia,chegou o tempo em que é preciso caminhar.
Anda.Percorre o caminho que é feito de escolhas e de todos os nãos que você carrega dentro de si.
Deixe-os ao chão e anda,sem olhar pra trás.
Ouse abrir a janela e contemplar o sol.Arrisque,por entre a incerteza dos passos,
fechar os olhos e se deixar levar pela brisa leve que bate,constante.
Deixa que ela sopre em cada marca que o tempo deixou.
Caminhe,passo a passo,mãos vazias e vento no rosto.
O seu tempo é agora.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

ausência

Peco perdão pela ausência
É que meus caminhos ainda estão em branco
Ainda há muitas pedras no meio e em todo percurso
Peço perdão pelos silêncios e pela falta de paciência
É que o sol lá fora ainda é muito para todo o trabalho cá dentro
Há tanto trabalho e a saudade é tanta
E o cheiro de edredom e pipoca ainda pesando por cima de tudo
Por sobre o silêncio, as risadas e filmes, no compartilhar da experiência.
Já vão longe as tarde de teatros, as tintas e papeis,foi tudo tão rápido, não seria possível adiar só um pouco o caminhar dos ponteiros?
O calendário diz: não
Agora é a vida, das conquistas e o trabalho, em infinitas horas de ausência e cansaço,
A lembrança dos cachos a percorrer a casa e o mais fundo da minha memória.
La fora já é sábado e eu ainda tenho tanto a fazer. São textos e livros e nomes e tudo
o que eu queria era atrasar mais uns anos o momento de sair.
Onde as danças e músicas, onde o cheiro de bolo e os passeios, onde o caminho compartilhado?
Há um tempo em que a vida é uma ordem e o silêncio, uma espera. Aqui dentro, quanta saudade.

sábado, 11 de agosto de 2012

Sobre o tempo de sempre...

Era um menino que sonhava em descobrir o mundo.
As pequenas experiências da infância não cabiam em sua curiosidade.
Passava os dias experimentando as cores e texturas daquele pequeno quintal onde o tempo corria lentamente.
Pela manhã já era a mãe descendo as escadas, as trouxas de roupa para lavar no tanque de pedra.
As tias, lá em cima, ensaiavam uma discussão, enquanto o irmão menor, no espanto de aprender a andar, enlouquecia toda a família ao caminhar em passos largos pelo piso de madeira.
Entre as tábuas, era possível ver os quartos de baixo, território fechado às crianças.
Lá dentro moravam as ferramentas do vizinho mecânico e a curiosidade de todos os pequenos.
Vez em quando, em expedição, juntavam-se cinco ou seis meninos,
atravessando o quintal e pisando na terra molhada dos bambuzais,
ou apostando corrida por entre os galhos da mangueira onde se dependurava o balanço,entre idas e vindas.
Súbito um talo de cana atravessa o pé do irmão menor, que já acompanhava o menino, apesar de seus protestos.
Num repente, segurou na mão do irmão caçula e puxou o talo fino, por entre o espanto dos meninos. O sangue e a dor não o limitavam.
A dor maior era o silêncio, quando havia o jantar da família.
Eram sete, o pai, a mãe, duas tias, a avó e o irmão menor.
E o menino queria falar, mas não era costume de se deixar ouvir voz de criança em mesa de jantar.
Criança era feita para mão no garfo e boca calada, um tapa fazendo-se necessário quando uma ou outra palavra escapava da boca sem controle..
Gostava de andar, de conhecer pessoas, de encontrar o pai na descida do bonde
e recolher as sobras da venda de sanduíches com a qual se equilibrava o orçamento familiar.
Melhor era quando sobrava o de omelete, feito no capricho, segundo as instruções do pai e os cuidados da mãe.
O menino se regalava com a meia bisnaga, na curva da ladeira, quase chegando em casa.
Tão bom quanto assistir à televisão em casa dos amigos ou passar as férias em Jacarepaguá.
Ali, no enleio das brincadeiras, era como se o tempo desse uma folga no exercício diário de durar e espichasse os dias para as bicicletas e as corridas. Coisa boa essa de saber-se eterno, como todo menino deveria se sentir..
Mas foi assim, numa distração, que o tempo esquecer-se de parar.
O tempo passou e vieram as dores, muitas e as espinhas, terríveis.
O menino já não tinha mais a certeza de ser eterno, Só queria era ser invisível,
para não mostrar ao mundo o que a puberdade fizera ao seu rosto.
As tias aprenderam simpatias.
A mãe procurou o médico, o menino parecia não ter mais paz.
Era o peso da idade por sobre seus ombros e não havia remédio que livrasse do suplício obrigatório do crescimento.
O tempo tornou a correr e o menino passou a acreditar que era realmente invisível e que ninguém poderia enxergar suas espinhas e foi cuidar da vida.
Estudou, começou a trabalhar, levou bomba no vestibular e conseguiu, depois de quase um ano, o privilégio de se tornar mais um careca na faculdade nacional de medicina..
E foi ali, na descida da escada, que o menino, que agora já era um homem, a viu pela primeira vez.
Era bela e tinha os olhos mais bonitos que ele já tinha visto e não, ela não achava que ele era invisível.
Casaram-se e foram moram em Santa Teresa, onde o bondinho passava em horários certos e o tapete do banheiro erguia-se, assombrosamente, ao menor sinal de vento no Largo do Curvelo.
Num descuidar do casal, passaram-se dois anos e o menino virou pai.
Nem bem começava a se acostumar em ser visível e já havia um muito pequeno bebê em seus braços, para ser cuidado, alimentado e limpo, sob a constante supervisão da mãe.
Para o pai sobravam as horas distraídas, quando o bebê dormia e o pai recostava a cabeça na cama, de leve, como que para não fechar os olhos.
Em segundos, dormia a sono solto, sendo necessário chamar, às sacudidelas.
Houve um dia em que a cadeira virou com bebê dentro e quase pararam, pai e cadeira, porta afora, ante a bronca que levou da mãe.
De tão assustado não percebeu que o bebê virou menina, dessas que gostam que se contem histórias. E ela perturbava, pai e mãe, na tarefa diária de entreter cabeça de criança que gosta de imaginar..
Restava ao pai a constante tarefa de contar história e abrir a janela do quarto para a entrada do pássaro azul, do cazuza e do sítio do pica-pau amarelo, personificados na contação de histórias feita na beira da cama cor de rosa.
Coisa difícil essa de ser pai de menina que sonha com laço de fita, isso o pai não havia visto ainda e havia coisas que ele não lhe podia dar.
Mas deu-lhe histórias, para ela aprender a sonhar, e imaginação para construir suas próprias.
E deu-lhe caráter, para saber-se igual e ainda assim respeitar o diferente e uma personalidade, que chega de manso onde quer que vá e um frouxo de riso que não há quem segure quando a piada é boa..
E então o tempo mais uma vez passou.
A menina cresceu e muito antes de se tornar mulher, ela virou mãe.
Era um susto e dessas dores que são impossíveis de se impedir de viver.
Mas o pai estava lá e ele deu colo, logo agora quando ela precisava urgentemente aprender a tarefa de dar colo a alguém.
E a menina que virou mãe, logo logo aprendeu a ser adulta e a segurar pelas mãos a outra menina que a chamava de mãe.
E eles, seu pai e sua mãe, continuavam lá.
Foram tempos difíceis, de dores e separações.
Mas o abraço forte do pai e a segurança constante da mãe estavam ali.
Mesmo que fosse para dizer que não havia mesmo nada para ser feito e o tempo, sempre ele, se encarregaria de cuidar do resto..
E ele cuidou, seja nas tardes ensolaradas de passeios, jardins e teatro, ou nos domingos silenciosos em que as dores voltam, sem pedir licença.
Havia sempre um saquinho de pipocas a comprar e muita arte pra conter as incertezas e trazer de volta o sonho, em exposições e cinema, tantos quanto foi possível caber em cada fim de semana..
E um dia, a menina que virou mãe e virou mulher e nunca deixou de ser filha, abriu a janela e percebeu que o pai tinha feito 62 anos.
Ela queria poder colocar numa caixa, dessas que tem laço de fita em cima, tudo que ele lhe dera, mas o tamanho era proibitivo.
Queria lhe mostrar o tanto que aprendera e a compreensão profunda que tinha por ele,
mas quem é que sabe onde encontrar as palavras pra dizer a alguém que é insubstituível e que se possível, não se vá embora nunca, fechando a porta ao tempo?
O essencial não pode mesmo ser traduzido em papel.
Então ela chegou um dia, de repente, enquanto ele dormia na sala,
simplesmente plantou um beijo no alto de sua cabeça e disse, para que só ele e ela pudessem ouvir: obrigada.
De olhos fechados, ainda meio adormecido, o pai entendeu e subitamente sorriu.
Ambos haviam vencido o tempo,fazendo-se eternos.

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Amor

Sempre busquei o amor em vida
O amor por quem os sinos dobrassem e a boca calasse
Amor onde os olhos dissessem a palavra exata
E o peito parecesse explodir de vida,
enquanto eu repetiria insensata: infinitamente, infinitamente.
Foi de repente, numa curva da estrada, que o amor me apareceu.
Naquele tempo, não havia nada.
Nem imagem, nem toque, nem gesto.
A única coisa que eu sabia eram as palavras de um conhecimento já tão breve
e inexplicavelmente eterno.
Era mais do que conhecer o novo.
Era quase reconhecer o que me parecia sempre ter sido meu.
Não que não tivesse fugido.
Fugi o mais que pude da emoção que me pareciam correntes,
arrastando-me para longe de minha vida.
Mas foi ali,quando da primeira palavra ouvida,
Que a verdade caiu em meu colo: eu já não era mais eu.
Era mulher, não me pertencia e amava, tanto que não sabia medir.
As conseqüências dessa verdade eram muitas e não se fizeram esperar.
Eu sofri a cada segundo de ausência, mas a presença, posto que não fosse física,
enchia-me a alma de uma vida tão imensa que não me sentia capaz de vivê-la.
Antes morrer, no contato dessa certeza,
de que nada nem ninguém seria capaz de mudar o universo que se abria para mim.
Eu amava e já sabia que seria para sempre.
Não a ventura do vivido, mas a certeza de sentir.
E foram muitas madrugadas de um silêncio mútuo
Onde a música preenchia a alma e a comunicação se fazia presente em tantas vezes
que me dizia, quase com medo: "sim".
Mas as palavras que aproximam ,
são as mesmas cujo sentido atravessa a verdade do sentir e promovem o "não".
E foi quando me encontrei sozinha, num silêncio da falta,
e que compreendi que a verdade que descobri em meu afeto,
não me impediria de me afastar dele.
Não houve nada que eu não tivesse feito.
Mil palavras escrevi, de flores enchi a casa alheia,
Músicas e sonhos que descrevi em detalhes, na esperança de recuperar a magia do sim.
Foi em vão.
Os anos passaram e resolvi preencher de materialidade o encontro etéreo.
Penetrei num universo outro e conheci ruas de uma cidade distante.
Era como voltar para casa, depois de uma longa ausência.
Meu corpo encontrou outro corpo que há muito eu esperava
E as horas foram poucas para tanto dizer.
Mas a alma que eu buscara já não residia mais lá.
E nem o desespero mais absoluto me impediu de viver o “não" em todas as suas dores.
Eram esquinas em que eu esperava
E ainda que pedisse e suplicasse nada nem ninguém se fez presente
. Eu estava só.
Restavam-me dois caminhos:
Interromper o curso da minha vida e virar hipótese, na certeza de não suportar a dor
Ou caminhar para frente sempre,
na esperança de que haveria um dia em que a dor não existiria mais.
Caminhei.
A vida me trouxe reencontros de amigos e de amores.
Eu procurei dizer sim o mais que pude,
Afinal, era preciso prosseguir.
Às vezes, sem que impedisse,
ainda me transportava intimamente
Para o breve momento de silêncio
Em que compreendi que meu coração não era mais meu.
Abri-o, é verdade, a todos que se quiseram aproximar
Preenchi de vivências, firmei compromissos, era o caminho que podia percorrer.
Mas a certeza do pertencimento,
Essa me acompanha ainda hoje, em palavras que já não pronuncio
e em músicas que já não ouso escutar.
Destino difícil, esse de não se pertencer,
de ainda sentir dor quando a poética do mundo entra janela adentro
E o pôr de sol preenche o silêncio das mesmas palavras de anos atrás.
A verdade ignora o "não”, ela existe e é tudo.

sábado, 26 de maio de 2012

Da verdade e outros enganos

Que é a verdade,diriam vocês,é o conhecimento e o poder sobre os outros,alguém diria?nao,eu diria,a verdade e o verdadeiro poder são o mergulho nesse univers o infinto que se chama outro,compartilhar sua existência é reconhecer-se como igual nas falhas e na ignorância mas tambem na infinita capacidade de compreendê-lo e amá-lo em sua incoerência e saber que o tempo da dor e da mentira,também vai reerguer,mais cedo ou mais tarde,os laços de afeto e torná-los infinitos ao sabor dos ponteiros ,na curva do vento.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Enquanto isso,a vida

trilha sonora
Daqui de onde vejo, o mundo corre bem
São centenas de fatos e sons em profusão
E a promessa de uma vida melhor
As revistas alardeiam o progresso
e as imagens nunca foram tão coloridas
Há tantos caminhos a seguir
E todos me parecem chamar
Já é a arte em seu intenso redemoinho
A ciência das coisas que se insistem humanas
E a franca sedução dessa mistura que me faz respirar
Daqui de onde vejo pessoas reais, sentimentos reais,
Risos e lágrimas
na proximidade palpável do cotidiano em que desfio meus passos..
Penso até que sou feliz
Vez em quando uma música, um gesto,no intervalo da tarde vazia
ainda me faz mergulhar no caos.
É a hora mais morna de todos os meus dias
o momento em que sinto a porta se fechar lentamente,
como um silêncio que se instala de súbito.
E e então,sem avisar, uma lembrança qualquer me invade,
como um botão que se aperta para acender a luz.
É a vida,a verdadeira vida que chega
E uma certeza tão forte que chega a dar medo.
Não sou mais cérebro,mãos e pernas
Sou apenas sentir, pele e respiração.
Então fecho os olhos e me entrego ao sonho, num tempo etéreo de silêncio,
sentindo cada parte de mim integrar-se ao mundo com força desmedida, incontrolável.
Toco a superfície do tempo com todos os seus dolorosos segundos
a me dizer mais uma vez que ainda não é tempo de chegar o silêncio,
que a vida espera lá fora e que é preciso caminhar..
Então,coração pesado,mãos em espera,abro meus olhos
Retorno ao meu estado mais normal de coisas.
A realidade não é uma janela aberta onde passa o mundo.
A realidade é o intervalo inconstante e pleno de sentidos
desse tempo que ainda vai vir..
súbito,destruidor e infinito.
Enquanto isso,a vida como ordem.

domingo, 15 de abril de 2012

Orfeu


Olha pra frente, Orfeu
Pelo amor de Deus, Orfeu.
Não entra nessa de novo, quantas vezes já te disse?
Olha essa barca, já está chegando ali no final, você não vê o sol já se pondo, ali no horizonte?
Não, você não vê Orfeu.Você não vê nada.Você só sente,o tempo todo.
Você não vê que o tempo já traz de novo suas marcas,
Você não enxerga que não são os novos ventos que esse tempo traz,
São tempos de tempestade, Orfeu, não vá pra esse caminho
Você insiste em ouvir a reconstrução de tuas memórias,
Arrastar baús de recordações desgastadas
E cantar melodias esquecidas no tempo
Olha pra frente, Orfeu
É por ali, na porta entreaberta,
Que repousa o instante do ainda não vivido,
O silêncio do inesperado,
Todas as promessas que a vida ainda não cumpriu
Mas você insiste, Orfeu em olhar pra trás e se encantar com as sombras
Você não se deixa ser empurrado para frente,
Você crava seus pés e mãos na terra batida de um passado distante
Como se todo o universo dependesse de seus devaneios.
Já perdeu casa e amigos
Os cabelos caíram, as mãos se crisparam
Os olhos secaram
A boca calou
E você ainda a esperar por aquela primavera.
Não vê que já não há mais ontem, que a madrugada chegou
Que já não há mais vozes e música
Que as palavras envelheceram no silêncio da dúvida
que o tempo veio e relegou à poeira todas as promessas feitas.
Não chora Orfeu,é tempo de insistir
Insistir no novo, Orfeu, insistir na vida.
Já não há mais tanto tempo e você ainda a contemplar a noite.
Anda, olha pra frente.
É diante dos seus olhos que vai se descortinar uma nova realidade.
Mas ousa, Orfeu.
Ousa encarar o novo
Ousa deixar teu passado atrás da porta e seguir em frente, mãos vazias e vento no rosto.
Ousa ser feliz, Orfeu e seguir em paz.
Teu ontem foi belo
Mas o hoje o será ainda mais se ousar olhar pra frente e prosseguir na estrada,
Pôe teu sentir em tua obra,
Grita aos ventos toda a sua poesia,
Lance mão de tintas e pinceis e cubra o mundo com toda a sua dor.
Mas não, Orfeu, não olha pra trás.
É tão frágil, com tua paixão e tua poesia, saia daí Orfeu,
Talvez você não volte com vida desse novo e eterno retornar.
Não ouse voltar,
Não há tempo a perder,
A felicidade é um caminho que leva sempre pra frente.
Não chora Orfeu
O tempo passou e ainda resta você, vai embora,
Siga seu caminho, mas por favor não olhe pra trás.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Palco


Minha palavra é o mundo, meu objeto é a arte.
Minhas mãos erguem-se, vazias,em direção ao infinito . Por sobre todas as dores que carrego no peito paira a certeza do desconhecimento total e a ânsia de caminhar lentamente em direção ao sol.
Quero mãos dadas e companheiros ao lado,quero o infinito da luz e da sombra, entrelaçado em narrativas do silêncio. Por sobre todas as dúvidas permanecem os pés em bailado,cortando o chão de madeira desse velho palco em movimentos imprecisos mas constantes.
Daqui onde estou enxergo as cadeiras vazias na penumbra da sala.
Estão todos aqui ao meu lado,mãos sujas de tinta,por entre os véus e brilhos das fantasias sendo,ponto a ponto bordadas de lantejoula e cetim.
Ali perto , nas coxias, ouço uma pena a riscar o papel, desmanchando sentidos para além das palavras.
Há tanto a dizer, tanto a falar, mas é preciso permanecer em movimento, sempre e sempre erguer o corpo por sobre a música e postar-se de pé.
Sempre e mais do que nunca é preciso ficar de pé, no meio do palco, por entre as vozes e lembranças e oferecer-se por inteiro, lágrimas e sorrisos expostos como em convite.
Aqui estamos, vestidos de sonho, por entre imagens e tinta fresca respingando no chão,braços abertos e a cabeça erguida.Somos poucos e a luz é a escrita que delineia nossos corpos, dispostos em ciranda.
Já são saias e pés a girar e nossas vozes se erguem em canção.
Nossas mãos se juntam e somos todos um,um só sonho, uma só vontade de voar e existir para sempre, para além de nossas pequenas certezas,para alem de todas as dores e de todas as definições.
Somos humanos, não mais e nada menos do que essa complexa contrariedade que não nos limita mas ao contrário, é nossa própria respiração.
Nossa palavra é o mundo,nosso objeto é a arte.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

E Se

e se eu quiser,tudo,o pote de ouro além do arco-iris
o frio na barriga antes da montanha russa,o constante e incontrolável "se"?
Dispenso formatos e descarto certezas,
busco o benefício da dúvida no compasso do incerto
E se o erro atravessar o meu caminho
Será apenas mais um companheiro de viagem.
o essencial é manter-se sempre em movimento,
As mãos vazias em busca do mergulho em si mesmo
As pernas cansam mas não param de caminhar
O que busco é o sonho,não etéreo e impalpável,
mas vívido e pulsante ,presente e possível,será?
É preciso mergulhar,necessário arriscar mais uma vez ?
Será então impossível acomodar-se no mesmo lugar,ainda quem incômodo?
meu coração diz que não,que é imprescindivel caminhar,quem seria eu se ousasse não obedecer?
Pedaco de mim mesmo,à parte de minha propria existência
É minha propria incerteza o impulso fundamental da partida
Não há nada a fazer,não há como se esconder
A entrega é a única possibilidade.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

Sentir


Sentir vai além de onde demanda construir a razão
É a forma primária da lógica do existir
Perpassa muros onde moral e ética jazem dispersos ao chão
Trança teias de significados múltiplos por entre as brechas da linguagem
É palavra não dita, potência de comunicação, para além do falar
É voz que cala,
Olhar que cega,posto que delineia contornos da experiência de enxergar
Toque que aflora ao contato da pele perspectivas múltiplas
Onde o pensar busca a afirmação da verdade, o sentir desbrava a escuridão do talvez
Onde os olhos buscam a imagem, o tempo rasga a carne na profundidade da memória
Existir é um risco, sentir é um passo para alem de lugar nenhum, na desconstrução do nada.
Ser.