Enquanto tu abres a janela, eu espero em vigília que volte seu rosto só um pouco mais pra cá.
Sobre a mesa, recortes de vida, recordações de um tempo que passou.
Quando andávamos juntas, mãos dadas, sorriso no rosto.
Era o tempo dos porquês e teus braços se erguiam continuamente em direção aos meus
e o mundo era pequeno para todas as cores que eu queria te mostrar.
Era como se a ti reservasse a melhor parte de mim, todos os meus sonhos e fantasias
E aos poucos os erguesse um a um diante dos seus olhos.
Juntas construímos castelos e caminhos os mais belos.
Trememos ao mesmo tempo ante bruxos e dragões
De mãos dadas acompanhamos a trajetória de dezenas de heróis.
E quando tudo parecia não ter remédio, era sempre hora da pausa para a pipoca,
entre travesseiros e edredons.
Quisera poder ainda hoje curar todas as dores com um toque de chocolate e duas gotas de brigadeiro.
Quisera que ainda buscasse meu colo como um porto seguro,
mas são outras tuas urgências e eu tenho apenas duas mãos.
Vejo com alegria cada dia do teu crescimento e me orgulho tanto de seres o que és,
Mas percebo que a vida te afasta a cada dia mais de perto de mim.
Não há o que lamentar .
É do tempo e das engrenagens do mundo que te faças cada vez mais sua e menos minha,
enquanto passam as horas e os dias de tua existência.
E enquanto buscas a ti mesma, como é o fato de cada um de nós,
me deixo estar por aqui, aguardando que em dado momento da estrada,
voltes teu rosto somente um pouco para trás.
E então, desprovidos já de toda a raiva que a juventude te deu,
teus olhos possam enxergar novamente
um pouco de mim em cada ato seu
e enfim possa esboçar um breve sorriso,
enquanto caminhas em direção ao sol.
Um comentário:
Linda obra! Reticências da alma ao desconforto infinito deste "ser e não ter" inconstante...
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