terça-feira, 1 de agosto de 2017

O toca-discos

Outro dia, em casa de amigos, me dei conta das sonoridades distintas do LP, hoje conhecido como vinil...Venham falar de 5.1, DVD, CDs, todas as letras do alfabeto, nada mais belo, mais poético, do que o som contínuo do motor da conhecida vitrola, a agulha no prato e todas as músicas do mundo nas faixas negras de cada álbum. Me lembro de ter uma vitrola, dessas infantis e me fechar no quarto para ouvir música, discos ao lado, a cabeça no chão..Era comum "roubar" os LPs dos meus pais em busca de novidades e foi ali que descobri pérolas como Rolling Stones e Beatles, em inacreditáveis Compactos.. Me recordo com se fosse hoje a primeira vez que ouvi My Sweet Lord, de George Harrison em um desses compactos,onde uma maçã verde girava no centro de tudo...Aquele som,que era até então desconhecido, me pareceu fantástico, divino, não podia mesmo ser desse mundo.Anos mais tarde descobri:realmente não era... Um dia, remexendo os LPs empoeirados, encontrei Drummond e Vinícius em um mesmo álbum, ou eles me encontraram..Eram poemas, declamados pelos dois..Meio desconfiada,coloquei o disco sobre o grande prato do toca-discos da sala e me sentei no chão..E assim, sem esperar, surgiram as primeiras estrofes do "Caso do Vestido"...Enquanto Drummond falava,eu fechava os olhos, ouvia sua respiração, suas pausas, tentava decorar as palavras, o nascimento em Itabira, o ferro na ruas e nas almas...As palavras me tomaram, me senti voar pra longe.Diante de meus olhos, as ruas da cidade mineira ganhavam cor e cheiros que eu jamais esqueci..Parecia incrível que o lado B pudesse ser tão bom quanto o primeiro.Então veio Vinicius e seus sonetos,sua busca da mulher amada,sem medo,sem hesitação...Que versos!que ritmo!eu deitava bem próximo à caixa de som, para ouvir todas as pausas da leitura, queria decorar as palavras, chegava a voltar várias vezes na mesma faixa para que o versos persistissem todos na memória..Ao fundo, o barulho do motor da vitrola enchia de vida todas as frases..Muitos anos se passaram,mas a poesia dessas tardes,de descoberta de mim e do mundo,ainda está ali, na poeira das capas, no chiado das músicas e sons que ficam infinitamente mais belos sob a agulha do toca discos...

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