segunda-feira, 19 de agosto de 2019
Sobre máscaras
Quase tão fácil quanto morrer. Finalmente a verdade dita, vívida e dolorosa, aparente no corpo que latejava. Porque não se tratava não apenas de dizer, mas de viver a verdade na própria carne. Por isso a escolha, o desnudamento que as palavras exatas, que somente as palavras exatas podiam conferir. Finalmente recusara-se a participar do teatro das pequenas verdades, tão convenientes quanto supérfluas, necessárias (necessárias?) à convivência rasa entre adultos. Nos interstícios do cotidiano, contudo, meias verdades e intenções escondem todos os nãos ditos, as lágrimas não choradas, as mãos retorcidas em agonia e a espera por um instante de silêncio em que o sentido se revelasse como por encanto, mas não, não era suficiente a espera do encontro, era preciso agir, erguer-se em meio ao vozerio abafado, plantar-se no meio de um salão lotado de possibilidades, fechar os olhos e deixar que as palavras saíssem do meio do peito, como um corte profundo que sangra a vista de todos. E então, no silêncio que se ergue, diante da insuspeitada nudez do sentir, a suave constatação das mãos surpreendentemente vazias, e a pele exposta ao escrutínio alheio, à espera de uma resposta que, sabe-se, não virá.. Em silêncio sairá da sala, tentando não esbarrar nas mesas, tropeçar nas pernas, percorrendo o corredor e tomando a porta de saída, quase em fuga. E o que se ganhou – é a pergunta que grita, por entre os lábios cerrados. No fundo a resposta estava ali, no centro do espelho. Ganhaste a ti mesma. Na coragem de retirar suas próprias máscaras, tantos anos depois, tantas batalhas perdidas, jogar teus medos pelo chão e ir a uma a uma pontuando tuas fragilidades. Independente da resposta, não há mais nada entre tu e ti mesma. Finalmente. Teu corpo e tua alma te pertencem, não mais para preencher vazios alheios ou ocupar lugares pré-estabelecidos. Finalmente, ocupas o lugar dentro de si mesma, que o medo e a raiva sempre te impediram de ocupar. A mais transparente combinação entre poesia e intensidade, a mulher que sempre esperou para ser, um existir que não te faz presa, mas ao contrário, te libertam da ilusão de não escolha. Finalmente és livre.
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