sexta-feira, 3 de abril de 2020

Paisagem

Enquanto o mundo desmorona, aqui e ali, há um fragmento qualquer de poesia que me toca e me toma, em meio ao caos e que mantêm meus olhos fechados, em profundo estado de escuta, enquanto os horrores das mortes e narrativas se tornam um burburinho confuso que não alcança meus ouvidos. Porque são outros os sons que eu ouço e as imagens que me chegam ao pensamento. Porque eu meio ao silêncio cada vez maior, ainda há uma nota que persiste e um percurso que se abre, como um convite irresistível a seguir. Súbito não é somente a paisagem da janela que me move contemplar, mas as texturas e nuances que mobilizam corpo, alma e se fazem poesia diante dos meus olhos. À minha revelia ergo as mãos para tocar a imensidão da tua pele, de teus olhos fechados, do silêncio que se faz no mundo quando te observo dormir. Enquanto tudo se faz pausa, em uma atmosfera densa que permeia o quarto, uma infinidade de palavras me veem à cabeça, mas não conseguem alcançar minha boca, se perdem e meio ao caos que me tira a voz, que me coloca em estado de espera. Agora tudo parece respirar em um silêncio que eu não ouso romper, mas que se desfaz em instantes, no momento em que você me toca, que os espaços e sons, convertem em um só fluxo e calor, de vida e movimento. Porque em meio a tudo que diz não, há uma outra força, maior e inescapável, que me convida a dizer sim e que me faz arriscar a ter esperança em meio a tudo que não pode ser.

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